quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009

Ciclo de entrevistas - Prof. Sérgio Nesteriuk - Anhembi Morumbi

Prof. Sérgio Nesteriuk
Coordenador do Curso de Design de Animação
Universidade Anhembi Morumbi

Que leitura você faz hoje da animação, do 3D e dos efeitos especiais no mercado brasileiro?
A animação foi, sem sombra de dúvidas, um dos principais produtos culturais do século passado. É difícil encontrarmos alguém conhecido que não tenha tido qualquer tipo de contato com a animação. Desde década de 30, com a criação dos grandes estúdios e, posteriormente, na década de 40, com a criação das primeiras séries para TV, a animação vem povoando o imaginário coletivo das últimas gerações ao redor do mundo. No Brasil, desde o primeiro curta-metragem de animação realizado em 1917, a animação nacional tem ganhado grande destaque, sobretudo junto à publicidade e a produção autoral de curtas-metragens. Atualmente o grande desafio é aumentar a produção e a divulgação de séries e de longas-metragens. O governo, e a esfera pública de uma maneira geral, vem percebendo a importância do setor da animação para diversos outros setores do país, como a cultura e a economia. A animação brasileira vai ter, em minha opinião, um crescimento como nunca antes visto e ganhará grande projeção - nacional e internacional - em pouco tempo. Iniciativas como o Programa Nacional para Desenvolvimento da Animação Brasileira, AnimaTV, AnimaSur, o projeto de lei de cotas de animação brasileira na TV (1821/03), a portaria interministerial 796 entre o MCT e o Minc, o Funcine de R$ 50 milhões da Fundação Padre Anchieta, novos concursos e editais específicos etc vão levar, acredito, o Brasil ao nível das grandes potencias mundiais na área.
Em relação ao 3D, a animação, desde a chegada dos computadores ao seu universo, abriu novas e interessantes possibilidades de produção, distribuição e de recepção. Além disso, não devemos esquecer a velocidade com que a tecnologia evolui e se aperfeiçoa, como podemos tão bem perceber em termos de processamento, por exemplo.Em um primeiro momento, o computador possibilitou a criação de novas técnicas e recursos assim como facilitou outras tantas difíceis de serem realizadas de forma analógica. Assim, foi possível criar coisas novas e produzir outras tantas em uma velocidade maior, com qualidade igual ou até mesmo superior ao que se produzia anteriormente. Em um segundo momento, o computador passou a ser não apenas o suporte de produção dessas animações, mas também o de “consumo” dessas animações. É o caso, por exemplo, dos games – que, grosso modo, podem ser entendidos como animações interativas – e das novas tecnologias digitais, como observamos em aparelhos de celular, sites com interfaces animadas, animações interativas etc.
Em termos de linguagem vejo uma cisão clara entre duas linhas: uma que representa as animações mais estilizadas ou “cartoonizadas”, que não se preocupam com uma representação mais precisa do “real”, e outra que é, de certa maneira, oposta à primeira com a busca de uma representação mais próxima ao que se chama de “real”. Considero as duas formas interessantes e complementares.

Como a formação acadêmica pode ajudar a ingressar nesse mercado?
Com o aumento na produção de animações há, inevitavelmente, a necessidade do aumento de sua mão-de-obra produtiva. Claro que as pessoas podem aprender de maneira autodidata e se aperfeiçoar com a prática cotidiana. Todavia, entendo que a formação acadêmica pode auxiliar na medida em que, quando bem articulada, proporciona uma complementação fundamental na formação deste futuro profissional. Não podemos restringir o conceito de animação exclusivamente ao seu aspecto mais “técnico”. Mesmo para aquele que nunca pretende realizar seu próprio projeto e opte por se restringir ao uso de softwares, é fundamental conhecer aspectos diversos ligados às áreas da comunicação, das artes e do design, que estabelecem constantes interfaces com a animação. Costumo dizer que a animação, nesse sentido, não é diferente de qualquer outra área criativa: não existem escritores, cineastas, pintores, designers, músicos, publicitários e outros tantos profissionais que lidam com criação que não tenham repertório das principais referências de suas áreas e um bom conhecimento de cultura. Além disso, quando não se tem este repertório sempre se corre o risco de “reinventar a roda”, isto é, estar produzindo algo que já foi feito de forma muito parecida ou idêntica anteriormente. É sempre importante não perdermos de horizonte a própria origem do termo “animação”, que vem do latim anima e que significa dar vida a algo ou alguma coisa. Isso significa que fazer algo se mexer na tela é apenas uma parte da animação e não toda ela. Com o avanço da tecnologia e uma maior democratização dos meios de produção é possível que qualquer pessoa interessada consiga hoje, com algum empenho e dedicação, fazer sua própria animação. Entretanto nem todo mundo que faz uma animação consegue fazer uma boa animação, e eu acho que essa diferença está justamente na qualidade da formação que este animador vai ter – daí a importância da formação acadêmica.
Comente sobre algum caso de sucesso de animação, 3D aqui no Brasil.
Gosto sempre de pensar no Cassiopéia do Clóvis Vieira – cuja história você já contou no seu blog. Para mim é um belo exemplo, um caso claro de superação em torno de um sonho. Acho que todos os animadores deveriam conhecer melhor a história deste filme e usá-la de inspiração para suas próprias produções. Mesmo que finalizada no final de 1996, acho que a lição vale para sempre. Se formos ver é o mesmo espírito que norteou a produção de outras animações mais atuais, como o “Vida Maria” do Márcio Ramos super premiado no Anima Mundi em 2007. No âmbito comercial, temos diversas produtoras com cases de sucesso como a Casablanca, Mixer, Vetor Zero entre outras tantas, normalmente localizadas nos grandes centros comerciais do país. A diferença neste caso é que se tem uma grande estrutura de apoio e uma equipe qualificada e talentosa por trás das produções.
Quais são as suas principais fontes de inspiração?
Ao longo do tempo procurei estudar e acumular o maior repertório crítico e estético possível. Assim, criei um repertório próprio e certos valores daquilo que considero possui maior qualidade e/ou interesse para mim. Particularmente, acho importante não ficar preso ao campo da animação, pois, como disse, acho que animação dialoga diretamente com outras tantas áreas das artes, da comunicação, do design e da cultura de uma maneira geral. Pintura, escultura, teatro, dança literatura, cinema, enfim, podemos (e devemos) tirar referências de diversas outras áreas. Particularmente em animação, gosto bastante dos trabalhos do National Film Board do Canadá, do leste-europeu e, mais recentemente, da Gobelins (França). Mas sempre procuro ver coisas novas e constantemente as pessoas me mostram coisas que eu não conhecia e que acabo gostando também.

Qual a sua sugestão para quem quer se profissionalizar nessa área?
Tenho três sugestões principais: estudar sempre, não ter pressa em ser reconhecido e desenvolver um projeto próprio. Estudar, pelas razões que já apontei na segunda pergunta. Além disso, quanto mais a pessoa estuda mais ela aprender que sempre tem mais a aprender. A segunda sugestão é não ter pressa para se tornar reconhecido; isto não significa esperar sentado por um “milagre”. Deve-se estudar, trabalhar duro e acreditar no seu trabalho e na sua capacidade. Não se deve desanimar ou desistir diante de respostas negativas ou de dificuldades - nem sempre o caminho mais curto é o melhor caminho. Se você leva a sério o que faz e se o seu trabalho tiver qualidade, um dia, mais cedo ou mais tarde, a sua vez vai chegar.Por fim, acredito que sempre podemos aprender bastante com nossos próprios trabalhos, pois, além da autocrítica, muitas vezes, possuem características e dificuldades diferenciadas, que nos ensinam bastante sobre inúmeras coisas. Isso na Universidade é o que costuma acontecer com os diversos projetos que realizamos, principalmente com o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC). É preciso encarar o primeiro projeto próprio como uma grande vitrina, aquilo que vai ter maior peso no seu portfólio. Um projeto não é sinônimo de um monte de trabalhos agrupados; é algo bem maior, com uma proposta clara e bem definida, onde se pode perceber a mão do animador em todas as etapas. A título de exemplo, não é uma coletânea de objetos modelados – que também deve fazer parte do portfólio – mas um curta-metragem, por exemplo, uma história com começo, meio e fim e em que personagens, ambientes e ações interagem na formação de um todo maior que a pura soma das partes. Por isso mesmo este projeto deve ser pensado como um grande investimento, pois irá consumir tempo e recursos próprios. Além disso é importante lembrar que é algo que irá te seguir para sempre. Não importa qual seja seu futuro, este e outros projetos sempre o irão acompanhar e por isso mesmo têm que representar todo o seu potencial e capacidade.
Agradecemos imensamente o Prof. Sérgio Nesteriuk pelas Informações.

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